Por João Pedro Molina


E aí pessoal, tudo bem com vocês? Sejam bem-vindos a mais uma edição da nossa coluna “Pipoca Atômica”, nesse texto falaremos de outro clássico sci-fi que marcou a vida dos adolescentes da década de 80. Estamos falando da trilogia De Volta Para o Futuro.

Os filmes são protagonizados pelo adolescente Marty McFly e por seu amigo Doctor Emmett Brown, um estereótipo típico de cientista maluco com comportamento um tanto esquisito e cabelo sempre despenteado, com direito a um laboratório todo desorganizado, lotado de engenhocas mirabolantes e invenções malucas. A questão é que uma dessas invenções do Doctor Brown se trata de uma máquina do tempo instalada sobre um carro DeLorean DMC-12. Seu funcionamento, infelizmente, não é revelado. Apenas sabemos que seu motor é elétrico e que precisa de plutônio para uma reação nuclear gerar a quantidade de 1,2 gigawatts de energia elétrica para funcionar e alcançar a velocidade de 88 milhas por hora, onde toda a mágica acontece. Convenhamos, é uma velocidade bem baixa para uma viagem no tempo, mas a máquina funciona e por um incidente Marty McFly viaja de 1985, sem querer, para o ano de 1955.

Toda a confusão começa quando Marty toma o papel de seu futuro pai e conhece sua futura mãe que se apaixona por ele. Porém, se as coisas acontecessem desta forma os pais de Marty nunca se relacionariam e, portanto, ele e seus irmãos nunca teriam nascido. Sem falar em questões morais.  Tal evento dá início a trama da trilogia e atrapalha todo o futuro e a história de Hill Valley. Na verdade, todos os filmes se resumem às aventuras de Marty e Doctor Brown na tentativa de retomar as coisas assim como eram na linha do tempo inicial. 

É claro que devemos fazer algumas considerações, por mais que sua visão de futuro agora nos pareça bizarra, é importante considerar que o filme foi lançado em 1985 e, portanto, trouxe uma visão inovadora, totalmente empolgante e repleta de esperança para as pessoas da época. Imagina o quão longe era imaginar a existência de drones, roupas ajustáveis, carros voadores e até mesmo se comunicar por uma televisão. Nada disso estava perto de acontecer, mas os expectadores da época tiveram tempo suficiente para sonhar com este futuro. 

Além disso, o filme aborda uma discussão seríssima do mundo das Ciências e da Filosofia a respeito de viagens no tempo, trazendo uma interpretação muito válida do conceito e uma ótima releitura do famoso Paradoxo do Avô, referindo-se às possíveis inconsistências do presente caso haja alguma alteração no passado, livrando-se da concepção determinista de que tudo no universo já está determinado e só seguimos o script. Sendo assim, se tivéssemos uma máquina do tempo, o que aconteceria se você pudesse voltar ao passado? Quais decisões tomaria? Mataria Hitler ou qualquer outro genocida antes de seus crimes ou levaria um almanaque esportivo e os resultados da mega-sena para o seu eu mais jovem? 

Seriam muitas as opções, mas e se você, hipoteticamente, matasse o seu avô quando ainda bebê? O que poderia acontecer?

Logicamente, seu avô nunca conheceria sua avó e então um de seus pais nunca teria nascido. Por consequência, nem você! Então, como poderia voltar ao passado e matar o seu avô? Você nem existe! Existe!? Ué.

Por incrível que pareça, as leis da física atuais permitem a viagem no tempo. Essa discussão parte da Teoria da Relatividade Geral de Einstein que transformou o modo como o tempo era descrito. Na concepção da Física Clássica, o espaço é imutável e absoluto, já o tempo é interpretado como uma linha reta infinita, tanto em direção ao passado quanto em direção ao futuro. Espaço e tempo eram distintos um do outro, sendo apenas o cenário onde os eventos ocorriam. No entanto, a teoria da relatividade mostra que as dimensões de espaço e de tempo estão interconectadas, formando o que chamamos hoje de Espaço-Tempo. Ou seja, espaço e tempo se tornam variáveis interdependentes, as quais variam de maneira correlacionada. A uniformidade do Espaço-Tempo está sujeita à distribuição de matéria e energia no universo, significando: em uma região com alta concentração de matéria, perto de uma estrela ou buraco negro, por exemplo, o espaço-tempo sofre uma distorção, uma curvatura, impedindo os objetos e até a luz, de viajarem simplesmente em linha reta. É mais ou menos como colocar uma bola de boliche sobre um lençol, ela afundará e qualquer outro objeto colocado sobre este irá em direção a ela.

Então, quanto mais massivo for um objeto maior é a curvatura do espaço-tempo e, portanto, mais devagar o tempo passa. Sendo assim, se compararmos a marcação das horas em um relógio atômico ao nível do mar e outro no alto do Monte Everest, é esperado que o primeiro esteja alguns pouquíssimos instantes adiantado em relação ao segundo.

Obviamente que a variação gravitacional da Terra não é o suficiente para causar uma grande diferença. No entanto, se uma pessoa fizer uma viagem longa pelo espaço e depois retornar para a Terra, teria a sensação de ter viajado para o futuro, uma vez que o tempo para os seus conterrâneos seguiria sua velocidade normal no planeta, mas para ela, livre de qualquer distorção gravitacional, o tempo passará mais depressa. De qualquer maneira, foram esses os conceitos da teoria da relatividade que deram muuuuito pano para a manga dos aspirantes de viagem no tempo.

A principal hipótese acerca deste assunto é a de que um objeto extremamente massivo causaria tamanha deformação no espaço-tempo que o dobraria, encurtando as distâncias e conectando períodos diferentes. Esse objeto seria o nosso conhecido buraco de minhoca, o qual nada mais é que um atalho entre regiões e momentos diferentes do espaço-tempo. Dessa maneira, seria possível voltar ao passado, para quando seu avô fosse um inocente bebê e matá-lo. Mas então... o que aconteceria?

De acordo com Stephen Hawking isso seria um paradoxo “apenas se você acredita em seu livre-arbítrio de fazer o que quiser quando voltar no tempo” ¹. Na realidade, Hawking acredita haver uma espécie de Conjectura de Proteção da Cronologia, como se as próprias leis da natureza impedissem a viagem no tempo de maneira a proteger o passado. Sendo assim, por mais que as leis da física permitam as viagens no tempo, é altamente complicado e improvável que isso aconteça.

É justo dizer que viagens para o futuro são menos complexas, apesar de demandar uma tecnologia ainda inexistente, uma quantidade de energia muito grande e uma velocidade muuuito maior do que o DeLorean pôde alcançar. A ideia é basicamente a mesma do filme. Muita energia para acelerar, acelerar e acelerar mais um pouco até que se atinja uma boa parcela da velocidade da luz. Desse modo, de acordo com os conceitos de dilatação do tempo, quanto mais rápido estivermos, mais devagar o tempo passa. Portanto, alguns segundo dentro do DeLorean em altíssima velocidade equivaleria a horas e horas para uma pessoa do lado de fora. Seria como se tivéssemos viajado para o futuro. 

Vale lembrar que a velocidade atingida pelo DeLorean é de 88 milhas/hora, equivalente a 0,0000131% a velocidade da luz. Com isso não viajaríamos nem alguns milésimos de milésimos de segundo para o futuro. Eu disse que era uma velocidade muito baixa.

Por mais que o Doctor precise de um carro mais veloz e o processo de viagem para o passado funcione de maneira diferente, o filme trabalha os paradoxos de maneira inteligente e criativa. Doctor Brown ainda nos traz uma concepção interessante de criação de universos paralelos a cada vez que alguma coisa ocorre diferente de como aconteceu no passado. Então, ao invés de pensar em paradoxos ou algo similar, podemos apenas considerar que o diretor do filme selecionou os universos nos quais a tramas fossem mais divertidas e levassem à um final possível e coerente. E é claro que acertou. Além de ter recebido diversas indicações a prêmios importantes do cinema e ter sido prestigiado com um Oscar, o longa foi introduzido no National Film Registry, considerado um marco cultural dos Estados Unidos e digno de preservação pela Biblioteca do Congresso. De fato, ainda hoje os artigos colecionáveis da trilogia são itens obrigatórios para os geeks mais clássicos.

De volta para o Futuro inspirou toda uma geração, desde o modo de se vestir ao estilo musical do bom e clássico rock n’roll. Mesmo sendo da década de 80, a trilogia é uma obra atemporal, inteligente e engraçada que vale a pena ser assistida.