Por Kelvin Santos
Nesse mês, nossa entrevistada é a professora Cláudia Sibinelli, professora de educação infantil e biologia, ela nos conta um pouco de suas experiências como professora, e as dificuldades enfrentadas no ensino de biologia, e principalmente, nesse período extraordinário de pandemia.
1 -A senhora poderia nos falar um pouco da sua trajetória profissional e acadêmica? Onde se formou? A quanto tempo leciona?
Olá, primeiramente é uma honra e um orgulho muito grande participar desta entrevista com o meu ex-aluno Kelvin, que assim como muitos que passam por nós , nos deixam um pouco da sua vivência e nos enriquecem pessoal e profissionalmente.
Sou Cláudia, tenho 44 anos, sou católica, esposa, mãe de 2 filhos, professora e carinhosamente chamada de Cacau pelos familiares e alunos. Estou imersa neste Universo da Educação desde os 18 anos de idade, antes mesmo da formação técnica e acadêmica. Me formei em curso técnico em Magistério em 1995 e atuo na Secretaria Municipal de Educação de Itu há 21 anos. Durante este período atuei em Ensino Fundamental, EJA e atualmente sou professora de Educação Infantil. Para mim, ser professora é vocação e logo após terminar o Curso Técnico em Magistério queria buscar uma área que atuasse com Ensino mas que fosse diversificada da Pedagogia, então me direcionei para Ciências Biológicas, uma das minhas grandes paixões, e me formei em 1999 pela Pontifica Universidade Católica de Campinas. Por um curto período, mas muito significativo, fui professora de Anatomia numa Escola Técnica de Enfermagem e trabalhei no Centro Universitário Nossa Senhora Do Patrocínio, auxiliando em atividades de laboratório. Há 16 anos também sou professora de Biologia no Ensino Médio e técnico do Centro Paula Souza, atuando na Etec Martinho Di Ciero, em Itu. Minha vida profissional atual se resume em “escola de pequeninos” e “escola de grandões”, dois campos extremos da Educação, cada qual com suas exigências e particularidades, mas sempre com a mesma essência: o prazer pelo conhecimento e pela aprendizagem. Também fiz cursos de pós-graduação de especialização em Gestão Ambiental (2009) e Psicopedagogia Institucional (2013) e me considero uma eterna pesquisadora e estudante. A gente sai da escola, mas a escola nunca sai da gente. Há quem diga que pesquisa é apenas em grandes centros, porém é no dia a dia da sala de aula de um professor que a pesquisa também acontece, pois a cada ano, a cada turma você descobre novas formas e estratégias para acolher, trabalhar e conviver com uma grande diversidade de pessoas e famílias que chegam até você. Perceber que em algum momento você fez a diferença na vida de alguém é a conclusão de uma série de experimentos que foram testados, com objetivos pensados e repensados, com resultados
avaliados e reavaliados.
2 - Quais são as maiores dificuldades do ensino de Biologia nas escolas?
A Biologia é encantadora, então a busca por esse “encantamento” é uma das minhas prioridades, porém algumas dificuldades são constantes como para qualquer disciplina. Avaliar a intencionalidade, planejar, aliar com o cotidiano e principalmente estimular a aprendizagem é um dos grandes desafios. Atualmente os alunos têm acesso a muitas informações e portanto mediar essa aprendizagem relacionando-a com os conceitos e funções, e estimular o desenvolvimento de competências e habilidades é algo muito importante. Outro desafio é trabalhar de maneira interdisciplinar, já que a Biologia, além da ligação própria com as demais Ciências da Natureza: Física e Química, ela pode e deve relacionar-se às outras áreas do conhecimento para que o aprendizado se torne ainda mais significativo.
3 - Infelizmente, sabemos que a maioria das escolas não contam com laboratórios para o ensino prático, e sabemos que eles seriam de grande importância para o aprendizado e incentivo dos alunos, pois quando se relaciona a teoria com a prática eles conseguem visualizar melhor o assunto. Como a senhora enxerga isso?
As práticas são essenciais para o desenvolvimento não só cognitivo, mas também pessoais e interpessoais como trabalho em equipe, organização, capacidade de resolução de problemas. Apesar de nem todas as escolas apresentarem equipamentos, espaços ou mesmo funcionários para organização de material e experimentos práticos, podemos realizar práticas simples com um olhar científico, sempre estabelecendo um roteiro e combinados com os estudantes para que também tornem-se protagonistas dos seus estudos. De nada valem os laboratórios e equipamentos se não há um bom planejamento, organização e conscientização dos alunos para a prática. Logo, até experimentos que não demandam aparelhos sofisticados podem ser aplicados como estudos complementares e investigativos e proporcionar momentos de intensa aprendizagem. Digo sempre aos meus alunos: estimulem o seu olhar científico para observar as coisas.
4 - Nesse período em que estamos vivendo de pandemia, qual é a maior dificuldade para a senhora como professora e para o aprendizado dos alunos?
Neste 2020 estamos vivenciando um momento único e temos que tirar algum proveito disso, especialmente no desenvolvimento de nossas competências emocionais como: autoconhecimento, autorregulação, percepções sociais e capacidade de decisões. A maior dificuldade neste período é o tempo e o planejamento. As aulas não são apenas no momento que você está com os alunos. A preparação de uma aula começa quando você assiste um filme, lê uma reportagem, troca ideias com um colega de trabalho, observa a natureza. Um professor da área de Ciências da Natureza é um pesquisador e está o tempo todo “preparando a sua aula”. Com a pandemia o tempo preparatório aumentou. Precisamos ter cautela para abordar um conteúdo, não de maneira superficial, porém não tão profunda que não consiga atingir a maioria dos alunos, o assunto precisa ser significativo, precisa explorar a tecnologia, há necessidade de avaliação, novas oportunidades, tempo suficiente para visualizar e realizar atividades, momentos para tirar dúvidas e para conversar sobre os anseios e dificuldades. O professor, em um curto período, sentiu a necessidade de se adaptar à nova realidade com domínio da tecnologia, preocupação com um bom sinal de internet e equipamentos adequados, produção de materiais de boa qualidade de som e imagem, elaboração de algo autoinstrucional pois nem todos os alunos conseguem ter o acesso naquele momento, estar disponível, conhecer e navegar pelas plataformas, se atualizar e principalmente se cuidar física e emocionalmente para compreender que a escola está.
Outro desafio é também pedir licença para entrar na casa dos alunos, cada qual com sua rotina, vivenciando situações adversas como a própria doença, o desemprego, a insegurança, a falta de ânimo, dificuldades tecnológicas e de conexão, compartilhamento de aparelhos por todos os familiares etc. Uma frase muito utilizada nas minhas aulas é “Estamos longe, mas estamos juntos”, então é por meio de uma escuta ativa, um bom planejamento que vamos conseguindo nos adaptar constantemente. Tento colocar nas aulas o mesmo dinamismo das aulas presenciais estabelecendo um roteiro adaptado para cada aula, trazendo sempre uma dica de estudo para rotina, vestibular, ENEM ou uma reflexão para a vida. Tento diversificar os recursos com textos informativos, mapas mentais, jogos, vídeos, treinamento com exercícios, explorar bastante a criatividade e trabalhar com otimismo, apesar do cansaço e das inúmeras dificuldades. Gosto demais de música e isso não pode faltar. Eu participo de um grupo de música na Igreja Católica há 22 anos, então a vivência musical é muito presente na minha vida, então nas aulas tem músicas também para estudar: paródias, MPB associadas aos conteúdos e criações com os alunos. A parceria é indispensável, seja trocando ideias com os colegas de trabalho, o que nos fortalece como equipe, ou por meio de combinados com os próprios alunos oferecendo a eles oportunidades para se organizar para os estudos e dando as devolutivas do seu aprendizado. As sementes de qualidade estão sendo lançadas e se encontrarem um bom terreno pelo caminho e se receberem os cuidados necessários, vão germinar e no futuro colheremos os frutos de toda essa situação. Por isso a comunicação e o apoio da escola e da família é de suma importância para os nossos estudantes.
5 - A escola tem um papel muito importante, principalmente na formação de novos cientistas, afinal é na escola que temos os primeiros contatos com ciências como química, física e biologia. Qual é importância da escola e dos professores dessas disciplinas na formação de novos cientistas para a senhora?
Anteriormente falamos do “encanto das ciências”, portanto o incentivo e o estímulo são primordiais. A área de Ciências da Natureza é um campo vasto e diversificado, porém muitas vezes é classificada como uma área complexa e de pouco reconhecimento. Percebemos que educadores nessa área estão em extinção. Só entra nessa área quem tem paixão mesmo. O papel do professor é de um constante aprendiz, um mediador que vai por meio de suas ações, promover situações de aprendizagem significativas colocando seus alunos como sujeitos ativos e protagonistas do seu conhecimento. É essa paixão do professor pelo conhecimento e pelo papel de ensinar que irá contagiar seus alunos, despertando neles o desejo de se desenvolver e de aprender cada vez mais. Nas vivências em sala de aula temos que fazer nascer o cientista que ao perceber que tudo tem a sua função na natureza, interage com ela e tem o desejo de contribuir para o seu equilíbrio. O papel da escola é também construir as melhores condições para que seus alunos desenvolvam suas habilidades e para isso deve também ter esse compromisso de trabalhar em equipe e de valorizar cada aluno que passe por ela com todas as suas potencialidades e limitações. A nossa maior alegria e reconhecimento é ver nossos alunos estudando, ingressando nas Universidades e no mercado de trabalho com excelência. Saber que de alguma maneira, uma aula, um assunto, um gesto ou uma palavra contribuiu para o projeto de vida de alguém, é extremamente gratificante.
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